quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

diálogos

- comprei uma galinha.
- viva ou morta?
- morta, já vem pronta.
- como assim, pronta?
- assada.
- ah, você comprou um frango assado...

*

- gente, vou fazer um jantar pra vocês.
- você vai refogar esse frango?
- não me dou muito bem com tradução, o que é "refogar" mesmo?

*

pelo menos eu joguei o lixo no lugar certo!

*

Enquanto vemos cena de Breaking Bad, o professor e seu aluno mal-criado, Bel se vira pra mim:
- Está vendo, se vocês me tratarem assim eu vou ficar traumatizada... você reclama que eu faço as coisas errado mas devia estar feliz que eu não estou usando crack.


terça-feira, 17 de dezembro de 2013

eu e maria


Eu e maria estamos conversando com Rogério, nosso respectivo tio e tio-avô. Ele me sugere que o humanismo não está com nada, que eu deveria ler o Heidegger e tomar banho de ribeirão ao invés de ir às ruas. Maria me cochicha:

- Tia, ele não parece aqueles portugueses, Pedro Alvares Cabral ou Pero Vaz de Caminha?
- Por quê, Maria?
- Ah, esse cabelo branco comprido com um rabicho...

As coincidências às vezes são curiosas!

esperteza

Oi, Liloca, você fica esperta porque a gente vive mesmo num mundo em que só faz sentido ganhar dinheiro; se a gente não presta atenção, a gente se acha um fracasso. Bj, Gus Pai

É, tenho notado, ainda tenho muito que aprender, mas já iniciei a jornada. Beijos, Lila

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

fragmentos, ou a tentativa de fundar uma literatura americana

Oi, Liloca, estou com saudade de você. A gente vai se ver no Natal? Você vem pra cá? Obrigado por ter mandado calçar de pedras aquela parte perto da janela da cozinha, e construído aquele aparador de pau do mato do lado de fora da janela. Ali ficou muito bom para colocar aquela mesa de plástico e aquelas cadeiras. E outro dia eu percebi que ali é o meu atual ponto, o lugar em que fico melhor no mundo, descascando um legume, vendo o sol secar a roupa no varal, com meu cachorro deitado no chão, ouvindo a panela apitar no fogão pela janela aberta, lendo um livro, um jornal, fumando um cigarro à noite. Acho que era o Castanheida (não sei se é assim que escreve) que dizia que cada um tem um ponto onde está melhor sentado no mundo, o meu no momento é aquele. Um beijo, Gus


Boa, pai, que bom saber que você está feliz no mundo e no quintal calçado de pedra. Fico orgulhosa que isso tenha te trazido um centro mais apercebido. E também que o Teobaldo tenha passado a ser o seu cachorro propriamente. Você deixou de sonhar com ele ou assumiu o sonho? Irei no Natal sim, levando alguns presentes da reforma agrária que considerei ótimos pro momento atual: pinga, boné do MST e algumas comidinhas. No momento meu lugar no mundo fica nessa rua tadeu kosciusko, num quarto largo e iluminado vendo do alto a vida dos mendigos e transeuntes e o movimento das simpáticas senhoras portuguesas. Sou acolhida no caos de uma cidade selvagem – dentro dele existe paz. Um beijo, te amo! Lila

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

valendo: a diferença

hoje vi um pouco do abecedário do Deleuze, que trouxe a vontade de me debruçar sobre a questão do poder, cuja presença sempre tentei evitar mas não mais pude.

vivo num mundo em que caso o indivíduo resolva perseguir sua satisfação primeira enquanto homem (seja um ser orgânico, espiritual ou metafísico) ao invés de reproduzir padrões naturalizados que em geral fogem dessa sua tranquilidade essencial, ele simplesmente se torna alvo de desafetos. 

nem cheguei à letra P, portanto não sei se o rapaz francês fala de poder. mas o mundo revelou que as relações de poder são tantas e compõem de fato o todo dessa tecitura louca; não podemos ser simplesmente bons – no âmbito mais amoroso possível – sem que tenhamos que nos defender nesse espaço simples e pequeno que escolhemos ocupar; é como se para somente ser quem se é seja necessário erguer a cabeça e impor limites e fronteiras ad eternum. o mais estranho é que satisfazer-se em seu pequeno lugar causa desgosto àqueles que cismam em se colocar acima, de modo que se esquecem da própria existência primordial, aquela de seu corpo e espírito, se assim podemos dizer.

o que deleuze aborda como "fazer valer a diferença" pra mim implica a coragem de tentar ser quem se é, num processo constante e ininterrupto de construção desse "eu" que nem sabemos bem como identificar. agora, que tristeza dá compreender que o seu mínimo "eu" – em estando satisfeito na sua miséria – pode ser tão desprezado ou ludibriado pelas formas de poder vigentes.

a revolução, como já disseram alguns dos heróis das ruas, é deixar os "eus" se manifestarem livremente, sem as amarras de qualquer ismo ou chicote. mas muitos de nós ainda estamos mais preocupados com o poder que tememos perder para sermos capazes de libertar nossos "eus".