quinta-feira, 19 de novembro de 2015

o que faz feliz


hoje passei o dia na lojinha da economia solidária varrendo, limpando e enrolando brigadeiros de cacau orgânico. esqueci de levar o mp3 e fiquei lá só comigo mesma até o momento em que decidi baixar um aplicativo e ouvi a RFI a comentar a invasão de uma igreja em Saint Denis para matar terroristas (que sempre vêm do Oriente Médio, 'milagrosamente'). 

apareceu a Ana para acabar com minha solidão, vinha comprar sabão de coco babaçu mais uma vez pras amigas pra quem fez propaganda, e me contou sobre seu casamento com o japonês, e do seu orgulho de saber fazer tofu e muitas outras dicas de cozinha natureba das quais se gabava com toda a humildade [a capacidade de se gabar com humildade é para poucos, somente para os entendidos em matéria da vida humana, que parecem ter consciência do valor do que sabem e, paradoxalmente, da pequenez de seus dotes].

logo depois chegou o seu João, que há tempos não via, em sua mountain bike, vinha para prosear e me parabenizar pelo casório, enquanto ia narrando sua viagem de lua de mel pelo nordeste, de onde trouxe algumas mudas de cajá. conversamos sobre a maravilha da cidade pequena, e ele num dilema com a nova esposa, acostumada a viver em São Paulo. "e eu lá sou homem de ficar olhando arranha-céu?". soube então do tutu de feijão feito na panela de ferro "catadas nos quintais por aí, porque todo mundo agora só cozinha no alumínio, acham mais bonito, e tá fazendo o terror com o sistema nervoso das pessoas." seu milho foi plantado no mato, junto com tudo que tá lá, uma espécie de agrofloresta primitiva. jiló tem de monte. fez um pão caseiro para a família da nova esposa, mas parece que ninguém deu valor. eu perguntei por quê. "ah, todo mundo acostumado a só comer bobagem, né, minha filha...". e o seu João compartilhou comigo seus sentimentos sobre a tragédia de Mariana, sua roça, sua vida. 

voltei pra casa feliz, leve, alegre e fui me dando conta de que é o contato humano que traz felicidade, o diálogo real, em que o tempo leva o seu próprio tempo para as coisas serem ditas, ouvidas, para as pessoas se verem, se notarem, sem jorros discursivos inconsequentes. isto é um aprendizado diário para quem cresceu nessa civilização líquida. gostaria muito que toda a humanidade pudesse viver assim, como se vive aqui, nas ruas de paralelepípedo cheias de vagas e onde todo mundo sempre quer saber como vai você.


tragédias - novembro de 2015

Estava pensando justamente sobre isso. Não é preciso disputar o que é mais tragédia [no entanto, entendo quem se revolte com a enorme repercussão de Paris exatamente pelo fato de que algumas vidas valham mais e outras menos].
A perversidade do capitalismo é tanta, que já não pensamos mais sobre o que significa desenvolvimento ou consumismo. Desenvolvimento que antes se chamou progresso, e antes ainda foi tido como colonização. A terra já não aguenta tanto desenvolvimento, esse motor que nos torna executivos mergulhados num mar de lama e concreto, sem água e comida "natural".
Agora só nos resta filosofar... que sentido faz tudo isso?

caminhos

um aprendizado compreendi na aula de Gloria Arieira sobre o Gita. Krishna ali fala sobre como o dharma (ou nossa missão nesta existência) é algo não absoluto. ou seja, temos muitas escolhas, mas nenhuma delas é 100% correta ou não-correta. neste caminho não há possibilidade de reinar o absoluto, e o que podemos fazer é a cada dia a nossa melhor escolha segundo nossos princípios e crenças.
ele fala ainda sobre como cada um de nós tem o seu próprio caminho ou missão na vida. portanto, não seria solução tentar viver os benefícios e desafios de outra vida, precisamos viver a nossa e aprender a sofrer menos com todas as escolhas e desafios que surjam neste caminho que é somente nosso.

“One’s own dharma, performed imperfectly, is better than another’s dharma well performed. Destruction in one’s own dharma is better, for to perform another’s dharma leads to danger.”