segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Hainer Maria Rilke e trechos de suas cartas a um jovem poeta

"Não há nada menos apropriado para tocar em uma obra de arte do que palavras de crítica, que sempre resultam em mal-entendidos mais ou menos felizes. As coisas estão longe de ser todas tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou. Menos suscetíveis de expressão do que qualquer outra coisa são as obras de arte, – seres misteriosos cuja vida perdura, ao lado da nossa, efêmera.
(...)
Uma obra de arte é boa quando nasceu por necessidade. Neste caráter de origem está o seu critério, – o único existente. Também, meu prezado senhor, não lhe posso dar outro conselho fora deste: entrar em si e examinar as profundidades de onde jorra a sua vida; na fonte desta é que encontrará a resposta à questão de saber se deve criar.




As obras de arte são de uma infinita solidão; nada as pode alcançar tão pouco quanto a crítica. Só o amor as pode compreender e manter e mostrar-se justo com elas. É sempre a si mesmo a seu sentimento que deve dar razão contra toda a explanação, comentário ou introdução dessa espécie. Mesmo que se engane, o desenvolvimento natural de sua vida interior há de conduzi-lo devagar, e com o tempo, a outra compreensão. Deixe a seus julgamentos sua própria e silenciosa evolução sem a pertubar; como qualquer progresso, ela deve vir do âmago do seu ser e não pode ser reprimida ou acelerada por coisa alguma. Tudo está em levar a termo e, depois, dar à luz. Deixar amadurecer inteiramente, no âmago de si, nas trevas do indizível e do inconsciente, do inacessível a seu próprio intelecto, cada impressão e cada germe de sentimento e aguardar com profunda humildade e paciência a hora do parto de uma nova claridade: só isto é viver artisticamente na compreensão e na criação.
(...)
O verão há de vir. Mas só virá para os pacientes, que aguardam num grande silêncio intrépido, como se diante deles estivesse a eternidade. Aprendo-o diariamente, no meio de dores a que sou agradecido: a paciência é tudo."




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