Carta resposta a Augusto de Carvalho
De uma cidadã brasileira, sua sobrinha-neta, Lila Almendra
Caro Sr. Augusto,
Li sua carta,
na última edição do Ponte, endereçada à nossa presidente Dilma. Apesar de
concordarmos em relação ao risco de se juntar aos porcos e acabar comendo
farelo – vide o infame Michel Temer –, discordo bastante de sua visão aí do
céu, e decidi, portanto, me pronunciar. Importante ressaltar que faço isso não
por plena consciência da verdade, coisa sabidamente impossível, mas por ser testemunha
de fenômenos sociais que farão felizes ao Brizola e a outros tantos lutadores aí
do céu. Sou, talvez como representante de uma geração, simpatizante de projetos
alternativos de governo – e ser de esquerda, como Deleuze afirmou, implica
desejar mudanças para além do meu bairro, ansiar por um mundo melhor além das
fronteiras de meu estado.
E foi isso,
para a felicidade do Brizola, que minimamente se conquistou nesses últimos 13
anos do PT no Brasil. Negros e pobres com mais acesso à universidade comemoram
as primeiras gerações diplomadas de famílias marginalizadas desde a escravidão;
via internet pode-se ler artigos sobre o resultado positivo dos negros que
entraram nas universidades pelas cotas –
não querem perder essa chance de ouro, pois gostam de trabalhar e ter a
dignidade de cidadãos dessa suposta democracia racial. O bolsa família e o
empoderamento de mulheres no sertão, incluídas numa sociedade que antes as
negligenciava, mas que agora lança o olhar sobre seus filhos, suas necessidades.
Programas sociais que parecem óbvios em democracias maduras, mas que no Brasil
só conseguiram se implementar no século XXI, e frente a muito estardalhaço. São
mudanças reais e um inédito olhar para os mais fracos, uma vontade real de enfrentar a desigualdade e trazer para o jogo milhões de brasileiros à margem. E não para
por aí, setores da cultura festejaram a distribuição de políticas regionais,
que possibilitaram a artistas populares fora do circuito Rio-São Paulo se
engajarem na agenda cultural brasileira, que lhes dá importância e reconhecimento,
como uma amiga artista me contou. Sinto te dizer que essas conquistas
socioculturais estão indo por água abaixo com o governo provisório armado em
formato de circo no congresso.
Obviamente que
o governo de Dilma errou nas parcerias e nas prioridades ambientais e
econômicas, e em muitos outros pontos, como na manutenção da dívida de uma reforma agrária decente. Mas, e talvez infelizmente, até o momento este foi
e é o melhor governo de 2016. Não há prerrogativa que justifique um governo
interino hipócrita, integrado por incontáveis coronéis, a lançar canetadas a
torto e a direito desfazendo realizações diversas em âmbitos social, cultural e
ambiental. Se o senhor acompanhasse o que acontece em Brasília no momento veria
que o pulso firme de Dilma em não se corromper foi uma das causas de sua
retirada do poder sem razão.
Essa senhora,
que já lutou na clandestinidade pela liberdade e soberania da nação brasileira,
arriscando a própria vida, segue em luta por um Brasil mais igualitário, mesmo
em meio às víboras que se reproduzem no poder. Apesar de não concordar
inteiramente com seu governo, repito, me sinto impelida a defendê-la tamanha a covardia
com que vem sendo atacada, a primeira mulher presidente do Brasil – que com
garra e coragem enfrentou a máfia da elite política e econômica do país, somada
à mídia burguesa, que, com raras exceções, ataca a presidente sem lhe dar
chance. Em um país dominado por uma cadeia de televisão tão poderosa (tanto que
chega a ser vergonhoso contar isso a estrangeiros), Dilma seguiu imponente. Só
isso já me dá ânimo para estar do lado dela, e não do lado deles, que com seus
interesses escusos não me representam. Augusto, quem está do lado do governo provisório
é um ator chamado Alexandre Frota (que o senhor felizmente ignora), em nome de uma
educação sabe-se lá qual... o ministro das relações estrangeiras é Serra, cuja
ânsia neoliberal tercerizante dá arrepios. O mais recente dos atos federais foi
a anulação do veto anterior de Dilma ao aumento de mais de 40% para o
judiciário, oficializada por Temer há poucos dias; num país de milhões de
desempregados, é de fato desastroso que irresponsáveis tomem o poder. Ou seja, se
estava mal com ela, note que vai bem pior sem ela. Torço para que o senhor
consiga outras fontes aí do céu, além da mídia brasileira, e, te peço, ore por nós.
PS: uma publicação, em tempos de
crise é a Revista Apuro, feita pela juventude que ainda anseia por alguma coisa
diferente.
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